Oddity (2024), escrito e dirigido por Damian McCarthy, é um filme de terror sobrenatural que acompanha a jornada sombria de Darcy Odello, uma médium cega e proprietária de uma loja de curiosidades. Dentro de sua loja, Darcy coleciona alguns objetos amaldiçoados que pertenceram a pessoas falecidas. No entanto, esses itens carregam mais do que apenas histórias: eles contêm reminiscências de seus antigos donos, e Darcy, assim como sua mãe, tem o dom de tocar nesses objetos e reviver a dor que eles carregam.
Porém, ela não está apenas interessada no passado dos objetos de sua coleção – ela está assombrada por um mistério muito mais pessoal. Sua irmã gêmea, Dani Odello-Timmis (também interpretada por Bracken), foi brutalmente assassinada enquanto reformava a casa de campo que havia comprado com seu marido, o psiquiatra Ted Timmis (Gwilym Lee).
O filme começa com uma cena intensa, em que Dani, isolada em uma região remota, mal tendo sinal de celular, quando nessa fatídica noite, recebeu a visita inesperada de um paciente psiquiátrico de Ted, Olin Boole (Tadhg Murphy). O homem insistia para que ela abrisse a porta para ele entrar, alegando que havia alguém dentro da casa com ela. No entanto, Dani não confiou nele e essa decisão selou seu destino de forma brutal.

Atormentada pelo assassinato, Darcy decide buscar respostas por conta própria. Seu caminho a leva de volta à casa de Ted e Dani, onde ele agora vive com sua nova namorada, Yana (Caroline Menton). Determinada a descobrir a verdade, Darcy entrega um presente macabro ao casal: um manequim de madeira de sua coleção, a peça enigmática que logo se torna a presença mais pertubadora na casa. O manequim, posicionado silenciosamente na ponta da mesa de jantar, parece ganhar vida própria, sempre mudando de posição e causando uma atmosfera de terror crescente dentro da casa.
Com a chegada de Darcy, o ambiente na casa de Ted se torna cada vez mais opressor. Objetos começam a desaparecer, barulhos inexplicáveis ecoam pelos corredores, e Yana, cada vez mais assustada, sente que não está sozinha. No entanto, Ted, cético, minimiza suas preocupações, assegurando que tudo não passa de coincidências. Conforme o tempo passa, o longa conduz a gente por uma jornada de mistério e horror, em que cada cena é meticulosamente trabalhada para aumentar a tensão.

Desenvolvimento das Personagens
Carolyn Bracken, assumindo dois papéis, entrega uma performance impressionante. Nossos breves momentos com Dani nos mostram uma fotógrafa espirituosa, gentil e perspicaz, o que faz com que o público se envolva emocionalmente com a busca de Darcy por respostas. Darcy é uma protagonista complexa, cuja dor e obsessão pela verdade moldam sua jornada. Sua cegueira não a define apenas como uma limitação física, mas como um simbolismo de sua conexão com o mundo espiritual. Dotada de habilidades psíquicas, ela utiliza seu dom para acessar memórias ocultas e revelar os segredos ligados à trágica circunstância da morte de sua irmã. Bracken entrega uma atuação impressionante, oscilando entre a fragilidade de uma mulher de luto e a determinação incansável de desvendar o mistério.
Ted Timmis, vivido por Gwilym Lee, é uma personagem que transita entre a empatia e a frieza calculista. Como psiquiatra e marido de Dani, ele se apresenta inicialmente como um homem abalado pela tragédia, mas ao longo da narrativa sua presença se torna cada vez mais enigmática. Seu comportamento levanta questionamentos, e sua relação com Darcy se constrói sobre uma tensão velada, em que os diálogos carregam segredos não ditos e a suspeita paira sobre cada interação.

Os personagens secundários também desempenham papéis cruciais na dinâmica do filme. Yana é uma farmacêutica cética e ríspida que se vê obrigada a cuidar de Darcy enquanto Ted trabalha à noite no hospital. Ela inicialmente parece ser apenas uma figura deslocada no centro dos acontecimentos, mas sua presença se torna essencial conforme a história se desenrola. Seu desconforto crescente dentro da casa por causa do manequim e sua interação com Darcy acrescentam camadas de suspense à trama. Já Olin Boole traz um elemento de imprevisibilidade, fazendo com que o público questione sua verdadeira intenção: se ele é um aliado ou uma ameaça iminente.
Cada personagem de Oddity é trabalhado de forma para intensificar a atmosfera densa do filme, criando relações envoltas em desconfiança, medo e um mistério crescente que se desenrola até o último momento.
Cinematografia
Damian McCarthy utiliza ferramentas para criar um terror sensorial, brincando com o que está escondido nas sombras e no espaço negativo das cenas*: enquadramentos que fazem com que o público olhe além dos personagens, antecipando o horror que pode surgir ou não a qualquer momento. Assim como nos grandes clássicos, a atenção é desviada de forma intencional, deixando o espectador sempre em estado de alerta. O manequim de madeira é o grande artifício de horror do filme, sua presença silenciosa e enigmática cria uma tensão insuportável, fazendo com que cada interação com ele seja carregada de medo e expectativa.
O mistério por trás do assassinato de Dani se desenrola em camadas, revelando segredos e mudando constantemente a percepção do público sobre os personagens. O longa se destaca bastante por sua atmosfera opressora e por um terror que se constrói com sutileza, culminando em um final impactante que manterá a gente pensando nele por muito tempo após os créditos finais.
*Espaço negativo nas cenas: o espaço negativo é a área ao redor e entre as personagens principais de uma cena. Em filmes de terror, diretores costumam utilizar esse espaço vazio para criar uma sensação de desconforto. A ideia é fazer com que a gente fique atento a algo que pode (ou não) aparecer ali, aumentando a tensão.
Exemplo: em um corredor mal iluminado, a personagem está em primeiro plano, mas há um espaço vazio atrás dela, no qual o público sente que algo pode surgir a qualquer momento.

O Desenvolvimento da Trama
A narrativa de Oddity se destaca por sua estrutura não linear, um recurso que o Damian McCarthy usa de forma magistral para manter o suspense constante. Em vez de entregar todas as respostas de imediato, ele constrói um mistério fragmentado, revelado aos poucos através de flashbacks e pistas sutis ao longo da história. Ao avançar um ano no tempo após a morte de Dani e alternar entre passado e presente, o filme convida o espectador a montar o quebra-cabeça por conta própria. Algumas reviravoltas podem ser previstas, mas isso em nada compromete a experiência, pois a jornada é fascinante do início ao fim.
Sustos Inteligentes e Uma Atmosfera Densa
Um dos grandes trunfos de Oddity é a forma como McCarthy trabalha o horror. Em vez de se apoiar em clichês ou sustos previsíveis, ele cria uma atmosfera densa com detalhes sutis. O manequim de madeira de Darcy, por exemplo, se torna um dos elementos mais sinistros do filme, mas não da maneira tradicional: ele não é a personagem principal, nem o epicentro do terror, mas sua presença silenciosa gera uma tensão insuportável. Sua função lembra a do coelho mecânico de Caveat (O Alerta, 2020), seu primeiro longa, não sendo o “monstro” da história, mas um catalisador para o medo crescente.
Conforme os segredos sobre a morte de Dani se revelam, o horror muda de forma. A sensação de medo inicial dá lugar a uma retribuição sobrenatural, um ajuste de contas inesperado que culmina em um desfecho interessante. McCarthy não apenas assusta, mas brinca com as expectativas do público, entregando um final que surpreende e intriga ao tempo.
Oddity e a Expansão do Universo de McCarthy
Assim como em Caveat, Oddity constrói seu terror em um ambiente isolado e claustrofóbico, em que o medo surge tanto do desconhecido quanto das relações entre os personagens. O uso de um objeto amaldiçoado como símbolo do paranormal reforça a conexão entre os filmes de McCarthy e sugere um universo compartilhado.
Seja como for, Oddity se diferencia pelo seu equilíbrio entre superstição e horror. A narrativa enxuta permite que seus elementos mais marcantes brilhem, desde os momentos de tensão até a brilhante atuação dupla de Carolyn Bracken. Com um tom mais seguro e um enredo meticulosamente polido, McCarthy demonstra um amadurecimento claro como cineasta, consolidando seu estilo único dentro do terror.
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